"Se não é pela arte, pra que a alma pesando o corpo?" - Caio Soh

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Adotada

Eu escrevi esse texto para um concurso literário sobre adoção promovido pelo Grupo de Apoio à Adoção Quintal da Casa de Ana (www.quintaldeana.org.br) em 2007 e ganhei o primeiro lugar. Não era esse exatamente o fim que eu queria escrever, mas achei que ficaria meio estranho escrever um fim que parecesse "anti-adoção" uma vez que era uma campanha para a adoção, então mudei um pouco ele. Não gosto muito desse fim, mas enfim, não teve outro jeito.

Sim, isso mesmo que vocês ouviram, a-do-ta-da.

Na hora eu quis gritar, ou será que quis chorar? Bem, não sei exatamente o que era, mas aquilo foi me subindo pela garganta, me asfixiando, e como num grito, aquilo quis sair pela minha boca. Em vão. Minha boca não conseguia formar as palavras certas e como uma tristeza calada, meus olhos apenas alcançaram os de minha mãe num protesto silencioso.

Porque tantos anos de mentira? Por quê? E eu não acredito que eles não tenham me contado. Era tão simples. Sempre fomos tão apegadas, eu e minha mãe, será que devo chamá-la de mãe? Já não importa agora, queria poder sumir, ir para um lugar bem longe. Meu mundo foi construído numa mentira, ele era uma mentira.

Pensando melhor, acho que no fundo eu sempre soube, e eles sabiam disso, mas mesmo assim não me contaram. Minha... mãe, sim, minha mãe, na verdade ela sempre foi. A confusão em seu rosto quando contei que eu sabia e depois suas lágrimas de desculpas estão bem vívidas em minha memória, qualquer um abraçaria e choraria junto, eu não, eu apenas a olhei com desprezo, saí e a deixei lá chorando. Olhando para trás, para essa situação, me sinto tão monstro quanto achava que ela era naquele momento, na verdade me sinto mais.

Na época, eu quis conhecer os meus ais verdadeiros, minha mãe disee que ela não os conhecia, mas tinha os telefones do orfanato onde ela tinha me adotado. Ela ficou triste, mas achava que era meu direito saber. A princípio pensei em ligar imediatamente, mas tive receio de me decepcionar com a mulher que tinha me gerado. Pensei naquilo a semana toda, e por fim decidi que era melhor cuidar da minha mãe, ao invés de tentar achar a mulher que não me quis quando eu era pequena. Se não me quis naquela época, por que haveria de me querer agora?

Desde que descobri já se passaram 5 anos, eu, meu pai e minha mãe fizemos as pazes, e no ano seguinte eu ganhei um irmãozinho, que hoje está com 3 anos, e é alegria da família. Sou feliz, foi uma notícia difícil, mas sou feliz.

Nenhum comentário:

Postar um comentário