"Se não é pela arte, pra que a alma pesando o corpo?" - Caio Soh

domingo, 5 de dezembro de 2010

Olhos azuis

Eu descobri que o céu era azul no dia em que olhei nos olhos dele. Eram claros e límpidos como as tardes de abril.

Gostavam de me olhar, incessantemente. De me despir nua, daquele jeito que poucos olhos conseguem.

Brilhavam um brilho de criança na manhã de Natal, que vê os presentes embaixo da árvore esperando o doce e ansioso toque das mãos infantis a tatear e descobrir.

Miravam-me como dois céus azuis particulares, que eu podia ver, só eu podia ter.

Aqueles olhos azuis, me seguiam pela casa. Eu com os pés nus tocava o chão gelado ao sair da cama, um leve tremos me subia pelas costas, da mesma forma que os olhos azuis me faziam sentir na cama. Aqueles olhos azuis atravessavam as paredes comigo, por todos os cômodos da casa.

Ah os olhos azuis!

Mas um dia os olhos azuis se fecharam. E eu não tinha mais os olhos azuis. Aquele mar, perdi todas as chances de me banhar naquele mar para sempre. Nunca mais teria aquele mar matinal que me acordava toda mahã, me encarando como quem pergunta: estás pronta para viver?

Eu queria viver, olhos azuis, mas você não está mais aqui. Seu céu azul em que eu me banhava de felicidade todos os dias não está mais aqui. Por que olhos azuis? Por quê?

Por que fugistes de mim e nunca mais voltastes?

A água límpida e azul que batia nas pedras negras das íris de seus olhos. As rajadas ocasionais de vento que carregavam a areia branca de suas praias para dentro daquele azul sem fim. Que me carregavam como se tragassem um cigarro. Como um cigarro em que se traga o último gosto do vício. O meu vício.

Doces e ternos olhos azuis, que me faziam voltar todo dia pra casa. O que farei agora olhos azuis? O que farei sem você? Pra que casa voltarei?

Você me viciou, e como fico eu? Estou viciada em você...

E você se foi.

O doce manto negro cobriu seu azul sem fim me deixando só, vazia, transparente.

E você se foi.